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domingo, 8 de janeiro de 2012

A Criminologia Zodiacal (Ou "Ainda sobre Criminologias Etiológicas")

Zaffaroni afirmava - creio que no Em Busca das Penas Perdidas -, que a Criminologia positivista (paradigma etiológico) assusta menos pela ingenuidade teórica de suas premissas causais do que forma pela qual se infiltra e é aceita nas instituições.
Nos dias atuais, procurar explicar fenômenos complexos a partir de causalidades revela uma profunda ingenuidade epistemológica. No entanto, não são poucas as vertentes na Criminologia que seguem este rumo e obtém respaldo acadêmico - criam linhas de pesquisas em programas de Pós-graduação; recebem robustos financiamentos públicos e privados etc. Vejam os resultados das atuais tendências neurocriminológicas e os projetos criminológico-atuariais.
E tudo isso em nome da velha adivinha: "por qual razão determinadas pessoas praticam crimes?".
A "pergunta de origem" ainda embala os sonhos daqueles que acreditam que um dia irão encontrar e isolar o gene criminoso, erradicando da civilização o último resquício da barbárie.
A Criminologia crítica há muito demonstrou o porquê esta indagação é equivocada e de que forma esta imagem do crime encobre funções perversas geradas pelas agências punitivas.
Bueno.
O National Post, em matéria do dia 28.12 (leia aqui), divulgou pesquisa realizada pela Polícia de Chatham-Kent, Ontário. Durante todo o ano de 2011 foram analisados os dados das pessoas presas de acordo com o signo zodiacal. O resultado, conforme o gráfico abaixo, indica a maior incidência de arianos presos.
Minha primeira reação ao ler a matéria foi de deboche. Claro, a matéria é risível; suas conclusões ainda mais.
Certamente alguém ligado no tema dirá que o resultado é lógico, pois os arianos são mais impulsivos, diferentemente dos sagitarianos - peço desculpas aos especialistas, estou apenas criando hipóteses, pois não conheço nada de astrologia.
Mas depois de algumas risadas e divagações, lembrei imediatamente de Zaffaroni e me dei conta de que por mais risível que sejam as premissas, a pesquisa está sendo realizada por uma agência oficial. Provavelmente há um pesquisador responsável pela coleta e análise dos dados; provavelmente os dados foram debatidos e problematizados; provavelmente os resultados serão publicados em journals criminológicos. E não é de surpreender se a pesquisa for aprovada por comitês de investigação e ampliada para todo o Canadá, recebendo importantes financiamentos das agências de fomento. E se isso ocorrer, tenho certeza que inúmeros pesquisadores nacionais disputarão os recursos para validar a pesquisa com os dados de encarceramento no Brasil.
Por esta razão sigo afirmando que não podemos apenas desqualificar as atuais investigações causais (p. ex., neurocriminologia e biocriminologia) sugerindo serem retomadas lombrosianas. Isto não gera qualquer efeito. Pelo contrário, provavelmente esta origem será honrosamente aceita pelos neolombrosianos.
Penso que a crítica deve ser desconstrutora dos efeitos que esta lógica produz. E por mais risíveis que sejam as variações do etiologismo, precisam ser desqualificadas constantemente.